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ode à rotina

sobre o feio e o bonito. a minha rotina é ler.

Deparo-me muitas vezes com a questão: e tu, preferes suporte físico ou digital? Algumas dessas vezes, noto uma certa pré-disposição para o suporte físico e uma desconsideração arrogante pelo digital. Talvez esse facto esteja relacionado com o que falei há uns posts atrás - o carácter snob de alguns leitores.

Confesso que, primeiramente, torcia o nariz aos ebooks...o prazer de ter um livro na mão é incomparável e dá sempre uma certa elegância (na minha opinião). Neste momento, não consigo dar preferência a nenhum dos dois, porque reconheço os prós e contras de ambos. Penso que, hoje em dia, é essencial a presença das duas opções e prevejo que, no futuro, será muito mais comum encontrar um livro em suporte digital que físico.

 

Ora, os motivos que me levaram a mudar a opinião e a começar a apreciar ler digitalmente são simples. A principal causa foi começar a ler mais, recentemente. 

Sempre li muito, é verdade. Quando era mais nova lia um livro por dia e ganhava quase sempre prémios na biblioteca escolar. Depois, surgiu o computador, troquei de escola, mudaram-se os hábitos e o espírito...infelizmente, deixei de ler com tanta regularidade e este mau vício manteve-se até entrar na faculdade e redescobrir o prazer pela leitura. Com isto, não quero dizer que tenha parado totalmente de ler - não houve na minha vida período em que o fizesse ou sequer considerasse fazer.

A realidade é que a preguiça ganha muito terreno, à medida que crescemos. Sem uma biblioteca por perto, não penso muitas vezes em requisitar livros. No secundário não lia, pois as pessoas com quem me relacionava também não o faziam e eu não queria dar nas vistas. Perdi contacto com as bibliotecas em carrinha, mas espero retomá-lo em breve.

Descobri o booktube, empenhei-me a sério na escrita e decidi dar um giro na direcção do progresso. Então, voltei-me para o computador que, inicialmente, me afastara das letras e procurei livros.

Ler online não é fácil. A luz do ecrã inomoda os olhos, raramente encontro as obras na minha língua e é sempre diferente de poder folhear. No entanto, dei a volta à coisa, instalei o f.lux, começei a procurar mais avidamente e habituei-me. É uma óptima forma para treinar o Inglês que, por acaso, é a língua que estudo. Tenho acesso a sagas completas e a livros que não são traduzidos ou vendidos no meu país.

Planeio comprar um Kindle, mas por enquanto, a internet tem aberto as portas para a leitura. Os mangas foram outro dos motivos a levar-me a ler online, porque raramente os encontro e são quase sempre muito caros. 

Há causas mais óbvias para dar atenção aos livros em suporte digital. É bastante mais cómodo ler "calhamaços" quando não temos de levar o calhamaço atrás de nós. Pega-se no aparelho, leva-se para debaixo dos lençóis, bebe-se um café na esplanada sem ter de se folhear, a luz adapta-se para não magoar a vista e parece mesmo que estamos a ler de uma folha. Se for na internet, podemos fazer pausas para navegar e continuar a ouvir música enquanto lemos.

 

Não vou mentir, comprar um livro numa livraria é mil vezes mais satisfatório do que comprar um pela net. Estantes são o elemento de decoração mais bonito que existe. Ordenar os livros como queremos, fazer book jars, exibi-los, emprestá-los, cheirá-los, folheá-los...ah! É uma experiência mais íntima, remete-nos aos tempos nostálgicos em que a era digital não era tão óbvia. E as capas! Adoro capas. Adoro poder gastar dinheiro em volumes e volumes. Adoro estar num espaço público e reconhecer um parceiro de crime, pois ambos seguramos o nosso livrinho de bolso nas mãos. 

Não tenho possibilidade de saber o que a outra pessoa está a ler se ela estiver a usar um Ereader. Contudo, se ela preferir a maneira antiga, quem sabe se não vai permitir-me fazer conversa? Podemos ter gostos iguais.

É surpreendentemente refrescante encontrar outro aluno que esconde o livro nas mesas do auditório. Peço perdão aos professores, respeito totalmente a vossa profissão, mas tenho um problema e preciso de satisfazê-lo. Gera-se um certo tipo de cumplicidade quando o outro aluno está a ler algo que já lemos ou que desejamos ler e dá um tópico de conversa quando o livro é algo mais controverso. 

 

Resumindo, leio em suporte físico quando tenho espaço, tempo e disponibilidade, ou quando quero tirar o pó das prateleiras. Se é para gastar dinheiro, vou gastá-lo em papel real. 

Leio em suporte digital quando não tenho outro tipo de acesso à obra, quando quero um pouco mais de mobilidade, porque é mais discreto, ou porque quero manter-me no meu próprio canto. É mais íntimo.

Pressuponho que com o passar dos anos, mais e mais pessoas leiam ebooks, simplesmente pela evolução fantástica da tecnologia. Tudo evolui e, para aqueles que defendem que este não é um progresso, tenho a dizer que discordo! A internet e a tecnologia vieram facilitar o acesso aos livros, o que é maravilhoso. 

Ler no papel, ler no ecrã...no fundo, a única coisa que importa é que leiam.

 

Gosto muito de falar sobre livros em contextos mais descontraídos como no Tumblr ou redes sociais do género. Não gosto tanto de falar de livros com quem se entende por conhecedor de literatura - e olhem que as percepções que temos acerca de nós mesmos quase nunca correspondem à realidade; já tentei procurar por grupos de discussão portugueses no goodreads e desiludi-me bastante.

Não tenho nada contra professores e doutores, entenda-se. Tiro até especial prazer das conversas de alguns adultos com uma bagagem literária mais extensa do que a minha, mas não suporto snobs literários.

 

Nota: Tenho a minha quota parte de snob (literária e em tudo o resto). 

 

Há esta ideia errada de que as mulheres gostam de ler romance. Eu gosto de ler romance, mas não acho que deva reduzir-me apenas a esse género. Há quem goste de ler erótica - e aí aparecem os meus amigos de nariz empinado, dizendo que não, não, erótica não é literatura; Eu não gosto de Fifty Shades, não por ter erótica, mas por um conjunto de outras razões. No entanto, tendo a pôr-me à escuta quando alguém critica o livro, porque quero perceber quantas das recriminações se devem aos meus motivos e quantas se devem simplesmente aos preconceitos que há em relação à erótica. O que também incomoda é que uma mulher a ler erótica é quase sempre um caso chocante e eu não percebo de onde provém o choque.

Muitas coisas me irritam, a sério, mas entre a lista das mais irritantes estão aquelas pessoas que apontam os dedos a X livro porque não é literatura a sério. Agora, como disse, eu mesma tenho um pouco de snob literária. Torço o nariz quando me dizem que só gostam de literatura light, às vezes por mau humor, outras pela desilusão de não partilharmos os mesmos gostos e outras simplesmente porque acho que a pessoa está a perder ao limitar-se a uma lista restrita de livros e autores. Mesmo assim, eu leio literatura light, como leio clássicos aclamados, como leio manga. 

O que não gosto mesmo nada é de quem se tem lá nas alturas e gosta de olhar desdenhosamente cá para baixo - quem desdenha quer comprar, não é? -, isto em relação àqueles que só lêem o que vem nos manuais. Não quero limitar-me aos manuais, não quero ler pelo prestígio do autor, quero dar oportunidade aos novos autores. E esses livros que dizem ser tão bons têm complicações quando introduzidos no mundo moderno. Não quero ler apenas livros com protagonistas masculinos a fazer grandes coisas, para começar. 

Queria somente dizer que me irrita quem pensa que sabe tudo. Os meus gostos são melhores que os teus, eu leio os grandes autores, eu sou intelectual e tu não...alongava-se mais se eu deixasse. É certo que ninguém diz isto de caras, mas a atitude e as mensagens entrelinhas estão lá.

Era perfeito se toda a gente lesse, então não quero saber o que lêem desde que o façam. Perfeito, perfeito era tirarmos a cabeça da matrícula traseira e abrirmos os nossos horizontes. Gosto de pessoas eclécticas, mas isto sou só eu.